Cotonicultura anda de mãos dadas com a sustentabilidade

Consumo e produção responsáveis são os princípios de toda a cadeia do algodão.  

 Por: Quézia Silva Nascimento

 Publicada em 18/09/2023 17:39

O município baiano de Luís Eduardo Magalhães, que fica há aproximadamente 957 quilômetros de Salvador, é um verdadeiro celeiro da produção de commodities naturais, a exemplo da soja e do milho. Mas, a verdadeira fortuna vem de outro produto. Sob o rigoroso sol que castiga os municípios do interior do estado, nasce em meio ao solo severo, porém fértil uma das mais importantes matérias-primas do Brasil, o algodão. 

A Associação Baiana dos Produtores de Algodão (Abapa), teve início nos anos 2000 e de lá para cá ela vem atuando na orientação aos produtores durante todo o plantio, além de fomentar a cotonicultura na Bahia. Segundo dados da Associação, na safra de 2021/2022 aproximadamente 309 mil hectares de área foram plantados e mais de 527 mil toneladas do algodão em pluma foram colhidas. Já na temporada de 2022/2023 o total de área plantada ultrapassou os 312 mil hectares. 

Fazenda Santa Izabel, Grupo Franciosi | Foto: Reprodução Abapa

O Brasil está entre os maiores produtores e exportadores de algodão do mundo. Atualmente boa parte do que é produzido no país tem como destino países do continente asiático. Dentre eles estão: China, Bangladesh, Vietnã, Paquistão, Turquia e Indonésia. Das unidades federativas do Brasil, a Bahia é o segundo maior estado produtor de algodão do país, ficando atrás somente de Mato Grosso. De acordo com a Companhia Nacional de Abastecimento (Conab), a expectativa é que o estado baiano venha colher cerca de 600 mil toneladas de pluma na safra de 2022/2023. De todo o cultivo da Bahia, somente a região oeste é responsável por cerca de 97,8% da produção de algodão. 

Quem vê o Brasil como sendo um grande exportador atualmente, não imagina o caminho que ele precisou percorrer para poder ser reconhecido mundialmente. O então presidente da Abapa, Luiz Carlos Bergamaschi fala como foi todo o processo e também sobre a importância da transparência, que é um dos princípios da Abapa. 

"O algodão ainda não era conhecido. Foi preciso nós irmos até eles para mostrar o algodão para o mundo. Além disso, trouxemos eles para nossa casa e apresentamos a matéria-prima com toda transparência do que nós fazemos. As áreas de proteção ambiental, as algodoeiras, as fazendas, as máquinas, as reservas naturais, mostramos tudo", disse. 

Luiz Carlos Bergamaschi, presidente da Abapa | Foto: Reprodução Abapa 


Uso Consciente dos Recursos Naturais

Diante de uma imensa produção dessa fibra natural, é necessário que todo desenvolvimento, do plantio até o consumidor final, seja feito de forma responsável. Pensar na preservação dos recursos naturais e no uso consciente deles é um dos grandes diferenciais que muitos produtores do oeste baiano buscam sempre investir. 

Dentre os 12 objetivos da Agenda 2030 da Organização das Nações Unidas (ONU), está o estímulo às atividades econômicas para torná-las sustentáveis com foco no uso de recursos renováveis. Essa também é uma das metas dos associados da Abapa. Com isso, algumas ações são feitas para que o algodão brasileiro e baiano seja valorizado no cenário internacional por sua qualidade. 

O uso eficiente da terra e da água, a proteção do solo, o uso de tecnologia avançada, energia limpa e também o bem estar e segurança dos trabalhadores e produtores são algumas das estratégias sustentáveis utilizadas na cotonicultura baiana. Além disso, a Abapa também investe na qualificação dos produtores rurais, para que eles possam manusear da maneira correta o solo e que venham cultivar o melhor do oeste baiano. 

Douglas Fernandes, que é diretor do Centro de Treinamento e Tecnologia da Abapa, explica como é feita a qualificação dos produtores e também fala sobre a participação de outras instituições na formação dos mesmos.

"A orientação que os pequenos produtores rurais recebem da Abapa não vem apenas do centro de treinamento. Existe um direcionamento para que venhamos acolher essas famílias. Na região sudoeste, por exemplo, a Associação tem profissionais que ficam sediados lá para o trabalho de orientação. Quando falamos do cuidado e manejo do solo, além da Abapa, há outras entidades que desenvolvem o trabalho de inserção técnica dessas famílias", explicou. 

Na cultura do algodão, duas técnicas podem ser implantadas: a de sequeiro e a irrigação. O primeiro regime é uma maneira de cultivar o algodoeiro sem precisar de grandes equipamentos de irrigação. Ou seja, para molhar a plantação é utilizada a água da chuva. E o uso desse recurso natural é uma maneira de seguir um dos objetivos da Agenda 2030 da ONU. Por outro lado, a irrigação também é uma forma de suprir as necessidades da produção agrícola de uma região onde não se tem a presença da chuva. 

Após o período de 180 dias, desde o plantio até a colheita, uma máquina passa extraindo as plantas e em seguida elas são embaladas em grandes fardos que pesam aproximadamente 2.300 quilos, cada um. Após isso, o algodão passa pelo beneficiamento, que é a separação da pluma e da semente, feito por meio de equipamentos especializados. 


Fardos de algodão da Fazenda Zanotto Cotton. Cada um pesa em média 2,300kg | Foto: Quézia Silva


Utilidades do caroço

O consumo e a produção sustentáveis também fazem parte dos objetivos da Agenda 2030 da ONU. Isso significa que cada país precisa ter práticas que sejam amigáveis ao meio ambiente. Diante disso, tanto os pequenos produtores quanto os grandes empreendimentos reaproveitam 100% do algodão. No processo de beneficiamento, os resíduos que sobram servem de fertilizante para plantas. 

O mar de plumas brancas é realmente de encantar os olhos. Contudo, é do pequeno caroço do algodão que pode se ter um grande reaproveitamento. O caroço tem em sua composição: 58% de amêndoa, 36% de línter e 6% de casca. Dentre as finalidades da semente do algodão estão a torta bruta e a moída, que compõem a alimentação do gado, o óleo de algodão, as gorduras vegetais, o biocombustível e os cosméticos. 

Há também o línter, um subproduto derivado do algodão, que são as fibras mais curtas que ficam presas ao caroço na técnica de separação. Ele é composto de 75% de celulose. Dele é possível produzir papel moeda, tecidos cirúrgicos e até telas de smartphones. O línter produzido no oeste baiano é totalmente exportado para países a exemplo do Japão, Espanha e Estados Unidos. 

Todas as partes do algodão que podem ser aproveitadas. Do caroço pode ser feito ração para o gado e também o biodiesel. | Foto: Quézia Silva 


Utilidades da Pluma

Outra parte muito valorizada e utilizada do algodoeiro é a pluma. Após passar por inúmeros processos de classificação, vários fardos de pluma saem das empresas de beneficiamento do algodão e seguem seus destinos rumo às indústrias. Ao contrário da crença popular de que do algodão só pode ser confeccionado peças de vestuário, a pluma também tem outras finalidades. Fios para usar em artesanatos como o crochê e o tricô, tecidos para encadernação de livros, redes de pesca, fraldas e cotonetes são alguns dos destinos do algodão. 

As plumas que seguem para as indústrias têxteis para a confecção de roupas, ao chegar nas lojas o consumidor nem imagina os procedimentos pelos quais aquela peça precisou passar, e muitos não dão muito valor ao que estão vestindo. É aí que entra o Movimento Sou de Algodão. Lançado em 2016, o Movimento tem o objetivo de estimular a moda e o consumo responsáveis. 

A diretora de Relações Institucionais da Associação Brasileira dos Produtores de Algodão (Abrapa), Silmara Ferraresi, conta que dois grupos focais, jovens e mulheres, foram os mais atrativos na pesquisa qualitativa e quantitativa do início do Sou de Algodão. Além disso, ela fala que, como o Brasil ainda é o maior cliente se tratando da indústria têxtil, o Movimento tem o intuito de sensibilizar toda a cadeia, desde o pequeno produtor ao consumidor final, para que possa produzir e consumir de forma sustentável. 

"Lançamos o movimento 2016, mas começamos a estudar o que a gente ia fazer e de qual maneira seria lá em 2011. Como a indústria nacional ainda é o maior cliente do algodão brasileiro, nós decidimos: despertar o senso coletivo da cadeia têxtil nacional, agregar alto valor ao produto do algodão brasileiro, estimular e fomentar o mercado de algodão responsável, ou seja, a produção com sustentabilidade, e por último, decidimos valorizar e unir toda a cadeia do algodão e da indústria têxtil", afirmou Ferraresi. 

Dentre as finalidades da pluma está o fio de algodão | Foto: Quézia Silva

 

Minimizar impactos ambientais, utilizar a água de maneira eficiente, cuidar da saúde do solo, além de zelar e preservar a qualidade da fibra são alguns dos princípios que fazem com que vários produtores de algodão no Brasil recebam a certificação da Better Cotton Initiative BCI (Iniciativa por um Algodão Melhor). Essa certificação é como se fosse um selo de qualidade pela produção sustentável dessa preciosa fibra natural que é o algodão. 

Iniciativas como o Movimento Sou de Algodão preocupam-se em ser transparentes para os consumidores das marcas parceiras. Um dos grandes objetivos deste movimento em específico é fazer com que cada cliente possa ser atento ao consumo responsável, sempre buscando práticas de vida sustentáveis, como a utilização de peças de algodão, que é uma fibra 100% aproveitada. 

Já a Associação Baiana dos Produtores de Algodão (Abapa), também está sempre em busca de instruir aos seus associados a importância de dar continuidade na cultura do algodão, porém preservando os bens naturais. A Associação mostra que é possível produzir o melhor algodão do mundo, trazendo benefícios sociais e ambientais, provando que a cotonicultura pode sim ser produzida de forma ambientalmente responsável.

 

 

 

 





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